Ninguém é puro, todos temos influências e heranças diversas, mesmo as que desconhecemos. Pura é apenas a ignorância, incapaz de enxergar o que há de vida na fonte em que bebe. Negar heranças (genéticas, culturais, ideológicas) e influências (ambientais, familiares, políticas) equivale a mentir; ninguém se faz do zero, ninguém é verdadeiro ao afirmar-se apenas por autorreferências, ninguém é maduro quando é negacionista dos próprios limites, ditados por sua condição finita, embora tal pessoa possa ser presunçosa, narcisista, deseducada, movida por intenções que não confessa, mas que sua atitude revela: deseja apresentar-se como superior, com histórico exclusivo e que a poupe de desculpar-se por seus erros (normalmente atribuídos ao interlocutor ou a terceiro e, quando o caso, às circunstâncias incontroláveis do governo, do mercado ou ditadas por uma natureza inóspita) e a coloque, por direito quase divino, em posição de liderança entre seus pares, os quais veladamente considera inferiores. Resta para essas pessoas viver da própria retórica e explorar quem nelas acredite.