O que faz de uma comunicação algo que mereça reconhecimento como bela escrita, senão o simples e complexo fato de criar e expandir um universo particular com que o leitor se identifique, meio sem saber o porquê? Evocação e olhar para dentro, paisagem na percepção de um flâneur, introspecção exposta, sincera admiração por gostos e rejeições, a harmonia de versos e prosa, em rimas ricas, métrica e ritmo, enlevo.
Tudo isso teve início com uma revelação, uma hierofania, se quisermos ingressar na tecnicalidade de um vocabulário antropologicamente correto. Mas o antropológico somente é literário quando se desfaz da erudição científica e se transforma em paráfrases, palimpsestos, metonímias, metáforas, sinestesias, paradoxos, ironias, aliterações. As ciências, no laboratório ou no campo, ganham beleza quando recebem entonação e a intenção vai além do cálculo, para ganhar vida na imaginação de quem lê ou escuta com ouvidos preparados para uma descoberta, como plateia no Globe.
O verso, tanto quanto a frase bem colocada na ficção, transborda e transporta, acalma e excita, aguça sentidos, macera sentimentos e permite explodir em choro copioso, meditar momentos, fortalecer ânimos em ocasiões de incertezas, sonhar fortalezas quando há apenas escombros. Divindades que, dizem, inspiram sinapses, cordas vocais, tímpanos, uma sucessão que a rudeza de alguns diria físico-química de inteligência, mas que poderíamos chamar de mistérios da alma ou do espírito.
Os sons dos vales e das cidades, dos descampados e dos corredores de prédios, fazem memória, como nereidas, filhas prediletas da imaginação de todos, no Egeu que não temos senão como imitação nas águas de Furnas. Assim são nossos poetas e prosadores, captando, transformando e comunicando o que a natureza e a evolução da civilidade e da cordialidade nos dizem e ensinam na difícil arte antecipatória das tendências individuais e coletivas, ainda quando parece trazer de volta um passado, sempre por atualizar nas mais diversas formas de expressão. Eis o papel, a promessa e a realização de imortais e contemporâneos: a autêntica literatura, de cuja divulgação cuidam casas de cultura, como a Academia Mineira de Letras, e iniciativas nobres, que alguns diriam próprias de um verdadeiro Quixote a enfrentar a notoriedade da escassez, sob identidade construída como Livro de Graça na Praça.
Literatura é cultura e requer apenas difusão; assim, um povo conhecerá a si mesmo.
Muito bom. Bruno! Parabéns!