Cultura: pureza e compartilhamento

Cultura, aquilo que é próprio de um povo, o conhecimento, as práticas, os modos, as ideias, os gostos, as histórias que evocam o passado, justificam o presente e apontam o futuro, que são transmitidos de geração em geração, aperfeiçoados ou não, esse conjunto material e imaterial deve ou não ser exposto a influências exteriores e/ou partilhado e admitido a ser cultuado e desenvolvido por outros povos? A resposta a esta pergunta tanto poderá ser negativa como afirmativa, sendo correta em ambos os casos, conforme pressupostos e intenções.

Quem deseja pureza e conservação cultural dirá não e assumirá posturas de interdição ao compartilhamento, como hoje é comum acontecer quando se acusa ocorrência de “apropriação cultural” ou se afirma que alguém tem ou não tem “lugar de fala” a respeito de determinado tema, relativo a certa cultura, classe social, condição ou gênero. A crítica a tal posição refere ao esgotamento, à não renovação ou atualização da cultura, à ossificação, perda de substância maleável, enrijecimento e progressiva incompatibilização com tudo mais que esteja ao derredor, isolacionismo que fará perder-se no tempo e no espaço.

Quem deseja compartilhamento dirá sim como resposta à indagação, afirmando ser essa conduta um modo muito bom de atualização e desenvolvimento, não cogitará de interdição a mútuas influências e não afirmará reservas tais como increpações contra “apropriação cultural” nem oporá delimitação de “lugar de fala” sobre temas relativos a certas culturas, classe social, condição ou gênero, pois pretenderá que tudo seja aberto. A crítica a tal posição refere à possibilidade de demolição, escombros e extinção de culturas inteiras, incapazes de se defender e preservar diante de superioridade científica, tecnológica, econômica, financeira e militar de uma nação ou grupo de nações com pretensões hegemônicas.

O equilíbrio, ao que parece, está em praticar seriamente a democracia entre povos e nações, convivendo e compartilhando sem pretensões hegemônicas, pois assim a cultura circulará, como sempre ocorreu na história, permitindo que diversos povos e nações sejam beneficiados e que ninguém seja alijado dos debates e das possibilidades de progresso e desenvolvimento, nenhuma cultura se esgotará em si ou se enrijecerá a ponto de se tornar incompatível a convivência com as demais. Porém, é forçoso reconhecer que ainda não atingimos o patamar necessário ao abandono de pretensões hegemônicas no cenário internacional, mesmo nos cenários nacionais, mas é preciso começar de algum modo, com individualidades, até atingir coletividades, para que o melhor seja comum a todos, no limite em que não se perca o particular de cada cultura.

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