O Rio sempre teve múltiplas cores, mas as de Rugendas são as que mais me impressionam, pela realidade e pela fantasia, sentimentos puros e elaborados, rural e urbano nascente, como sua roupa de praia sugerindo que a desvende. Um tom jamais vivo como Kandinsky, mas algo que imagino entre a areia e o mar, penetrando o intervalo entre o tecido e a pele, salgando levemente. Cena alveolar, plena dos ares que enchem seus pulmões e que desejo tanto provar, um bafejo de espírito juvenil que apenas posso imaginar, tudo preciso ao detalhe e ainda assim de uma nitidez oitocentista que a mim me parece afirmativa de literatura que ainda não encontrou suas próprias palavras. Poderia ser, e na minha mente certamente era, Vinícius a cantarolar o prazer estético de existir naquela circunstância incomunicável. Um gingado em curvas, como silvos percorrendo o continente até esbarrar no Curral Del Rey e ficar em desfalecimento gentil, um encanto aos ouvidos que os olhos percebem. Entre as penhas de Cláudio Manuel estão belezas mineiras que ares atlânticos dificilmente descortinam, senão quando comparecem descendo montanhas para ganhar rumos da capital colonial. As vilas do ouro produziram muito mais que o metal e suas meninas revelam, ainda hoje, o espanto das mulheres às margens dos cursos d’água, com suas crianças ao colo e recato nunca desinventado. Se é alucinação sertã, de emoção cumulada de muitos varões lusitanos por aqui perdidos, se é miragem mourisca, de violência e conquista de espíritos pretensos e ascendidos, o passado não mo diz. Sei de mim com braços estendidos por amores que juram e acredito, são atemporais e infinitos.