Humanidade e religião

O que seria da humanidade sem a religião? Indivíduos ateus e comunidades ateias convivem com indivíduos e comunidades religiosas e conseguem harmonizar-se em tudo que não seja religião. Mas uma humanidade ateia seria concebível? Seríamos muito diferentes, se não houvesse religião em algum momento ancestral a fundamentar instituições ateias. A vida ganha sentido transcendente com a religião e ganha assim enorme atrativo. Sem transcendência, resta à vida apenas a rotina de estar presente para ser utilizada a favor do grupo ou de uma liderança. É na guerra que o contraste fica mais nítido, pois na guerra a vida é exposta a favor de um líder que incorpora as ideias de pátria e de nação, sob uma ideologia que se faz maior do que a vida e a morte do indivíduo e da coletividade. A religião é coletividade e precisa do indivíduo apegado à vida, mas a guerra é ideologia, é economia, é poder em ação e precisa do indivíduo e da coletividade desapegados da vida para prevalecer. Por isso, o discurso religioso é em forma de fábulas ou de histórias morais exemplares, ao passo que o discurso da economia, da ideologia e do poder é seco, áspero, despido de transcendência, colocando na pátria e na nação, simbolizadas em seu líder, a razão de ser imediata do indivíduo e da coletividade. No ateísmo, a tentação fascista se ancora na arte e em uma estética do poder; na religião, o fascismo se ancora em mistificação deturpadora, em uma forma de destruição consentida da essência da religião, para fazer convergir a mobilização da transcendência a favor de um poder terreno. Quando a intolerância religiosa se impõe, a transcendência se esvai, uma aparência de civilidade pode brotar, mas não será mais do que momento, não haverá verdadeira vocação à eternidade.

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